domingo, 14 de setembro de 2014

A Odisséia dos Judeus (pagina 9 a 16) do Livro Os Grandes Filósofos - A Filosofia de Espinosa de Will Durant



A ODISSEIA DOS JUDEUS
Olá, pessoal. Tudo Bem?
Achei esse texto em um livro publicado sob o nome “Os Grandes Filósofos – A Filosofia de Espinosa” de autoria de Will Durant, publicado há alguns anos (e põe anos nisso) pela Ediouro.
Para quem assistiu à aula sobre a História dos Judeus com o professor Darlyson, quando lê-lo, vai parecer que está vendo um filme. Tem tudo a ver e por isso quis compartilhar com os meus amigos.
A História dos judeus desde a sua dispersão é uma epopeia na História da Europa. Afastado de sua pátria pela conquista de Jerusalém pelos romanos (70 d.C.) e espalhado pela fuga e pelo comércio por todas as nações e continentes; perseguido e dizimado pelos adeptos das grandes religiões (cristianismo e maometismo, nascidos de suas Escrituras e Tradições); impedido pelo sistema feudal de possuir terras e pelas associações medievais de participar na indústria; encerrado em guetos congestionados, insultado pelo povo e roubado pelos reis; construindo com suas finanças e comércio burgos e cidades indispensáveis à civilização; rejeitado e expulso, ofendido e injuriado; - e, ademais, sem estrutura política, sem nenhum vínculo legal de unidade social, sem mesmo uma língua comum, esse povo maravilhoso susteve-se de corpo e alma, preservou sua integridade racial e cultural, conservou com amor seus ritos e tradições mais antigos, esperou com paciência e decisão o deia de sua libertação, ressurgiu mais numeroso do que outrora, famoso em todos os campos pelas contribuições de seus gênios e reintegrou-se triunfantemente, após dois mil anos de peregrinações, em sua antiga e nunca esquecida pátria. Qual o drama que poderia competir com a grandiosidade desses sofrimentos, a variedade dessas cenas e a glória e justiça desse final? Qual a obra de ficção que poderia se comparar a essa novela da realidade?
A dispersão começara muitos séculos antes da queda da Cidade Santa; saindo por Tiro, Sidon e outros portos os judeus haviam se espalhado no estrangeiro por todos os canos do Mediterrâneo – Atenas e Antioquia, Alexandria e Cartago, Roma e Marselha, chegando mesmo à distante Espanha. Após a destruição do Templo a dispersão transformou-se quase que em migração em massa. Fundamentalmente, o movimento seguiu duas correntes; uma ao longo do Danúbio e do Reno e daí mais tarde dirigiu-se para a Polônia e Rússia; a outra foi para a Espanha e Portugal com os conquistadores mouros (711 d.C.). Na Europa Central os judeus distinguiram-se como comerciantes e financistas; na Penísula Ibérica absorveram os conhecimentos matemáticos, médicos e filosóficos dos árabes e desenvolveram sua cultura própria nas grandes escolas de Córdova, Barcelona e Sevilha. Ali, no século XII e XIII, os judeus desempenharam papel proeminente na transmissão da cultura antiga e oriental à Europa Ocidental. Foi em Córdova que Moisés Maimônides (1135-1204), o maior médico de sua época, escreveu seu famosos comentário da Bíblia, o Guia para os Perplexos; foi em Barcelona que Hasdai Crescas (1370-1430) propôs heresias que sacudiram todo o judaísmo.
Os judeus da Espanha prosperaram e floresceram até a conquista de Granada por Fernando, em 1492, e a expulsão final dos mouros. Os judeus peninsulares perderam então a liberdade que desfrutavam sob o domínio tolerante do Islão. A Inquisição abateu-se sobre eles dando-lhes a opção do batismo e prática do cristianismo ou exílio e o confisco dos bens. A razão disso não foi porque a Igreja fosse violentamente hostil aos judeus – os papas repetidamente protestavam contra as barbaridades da Inquisição; mas o Rei da Espanha achava que poderia engordar sua bolsa com a riqueza pacientemente acumulada por essa raça estrangeira. Quase no mesmo ano em que Colombo descobriu a América, Fernando descobriu os Judeus.
A grande maioria dos Judeus aceitou a alternativa mais dura e procurou um lugar de refúgio. Alguns tomaram navios e procuraram entrar em Gênova e outros portos da Itália; foram repelidos e continuaram a navegar sofrendo dores e enfermidades até atingir a costa da África, onde muitos foram assassinados por causa das joias que acreditavam terem engolido. Alguns foram recebidos em Veneza, que sabia quanto devia aos judeus de seu predomínio marítimo. Outros financiaram a viagem de Colombo, homem de sua própria raça, na esperança de que o grande navegador lhes encontrasse uma nova pátria. Um grande número embarcou nas frágeis embarcações daquele tempo e subiu o Atlântico, entre uma Inglaterra hostil e uma França adversa, para serem afinal aceitos pelo grande coração da pequena Holanda. Entre eles encontrava-se uma família de judeus portugueses de nome Espinosa.
Daí em diante a Espanha decaiu e a Holanda prosperou. Os judeus construíram sua primeira sinagoga em Amsterdam, em 1598; e quando, setenta e cinco anos mais tarde , construíram outra, a mais grandiosa de toda a Europa, seus vizinhos cristãos os auxiliaram a financiar a obra. Os judeus estavam satisfeitos agora, se é que podemos chegar a essa conclusão pelo robusto contentamento dos comerciantes e rabinos a quem Rembrandt deu imortalidade. Mas pelos meados do século XVII o curso estável dos acontecimentos foi interrompido por uma severa controvérsia dentro da Sinagoga. Uriel Acosta, um inflamado jovem que sentira, como alguns outros judeus, a influência cética da Renascença, escreveu um tratado atacando vigorosamente a crença na imortalidade. Essa atitude negativa não era necessariamente contrária à doutrina judaica mais antiga; mas a Sinagoga obrigou-o a retratar-se publicamente, receando incorrer no desagrado de uma comunidade que os recebera generosamente, mas se tornaria irreconciliavelmente hostil a qualquer heresia ofendendo tão profundamente o que era considera a própria essência do cristianismo. A norma da retratação e penitência exigia que o autor se deitasse, atravessado, no umbral da sinagoga enquanto os membros da congregação passavam por cima de seu corpo. Humilhado além do que podia suportar, Uriel foi para casa, escreveu uma feroz acusação contra seus algozes e matou-se com um tiro.
Isso aconteceu em 1647. Naquele ano Baruch de Espinosa “o maior judeu dos tempos modernos” e o maior dos filósofos modernos, era um rapaz de quinze anos, o estudante favorito da Sinagoga.

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